Conto 4

Beijos
– Oi ursinho! Vamos tomar chá com as bonecas? – E em sua mão se mexia o pequeno ser feito com pelúcia azul e olhos de botão
– E passear? É melhor, né?!
– Nina pára com isso, vamos dar uma volta! Você já ficou o dia todo em casa... Vem, desce...
E partiram pela porta pesada feita de madeira escura, que se abria para um belo jardim de flores de onde através da cerca baixa de madeira se via uma linda rua. E foram os dois caminhando vagarosamente.
– Quero um sorvete! Compra pra mim? Quero de chocolate, com granulado colorido!
– Ta bom, mas fica quietinha Nina! – E Nina aguardava ansiosa por aquele sorvete que não era o primeiro que provaria em sua vida, e que também não seria o último, em seu olhar infantil havia algo de esperança para que aquele sorvete fosse o mais delicioso de sua vida.
Mas quem é Nina? Quem leva Nina para tomar sorvete? O destino poderia dizer que Nina é a menina de cabelos claros que sai com seu pai num dia comum de verão, mas não o destino quis incrementar, adicionar à vida de Nina mais uma graça, um toque especial, como quando flambamos pêssegos para sentir junto ao sabor aveludado da fruta e o espírito forte do conhaque. O destino deu à Nina este toque especial.
Um toque tão especial como o conhaque, amargo e que leva à demência como o álcool. Menina Nina morreu há muitos anos, menina Nina fez-se mulher, fez-se mãe, mas menina Nina ainda brinca com o urso azul de pelúcia que tem olhos feitos de botões de marfim. Menina Nina ama sorvete como se isso fosse a única paixão em sua vida, e todos os dias quentes sai e toma um com Carlos, que não é o pai desta menina-mulher.
Nina já foi poderosa mulher, linda. Casou-se com Carlos, seu amor, teve Mariana a menina de olhos tão escuros como a noite, como era linda Mariana, como corria linda em seu vestido de seda rosa pelo jardim florido e pulava nos braços da mãe. E todos os dias saia com Carlos para tomar seu sorvete, após dar um chá para suas bonecas e seu ursinho azul com olhos de marfim.
“Mariana? Mariana? Onde você está?”, e como as frutas que fervem no açúcar a vida de Nina incendiou-se, pequeno corpo jogado no jardim, a fragilidade do pescoço quebrado, o corpo sem vida no vestido azul como os olhos do pai. A menina subiu na árvore mais linda do jardim, que caiu tempos depois a golpes violentos do machado manipulado histericamente, a menina somente queria a mais linda flor e subiu, subiu enquanto ninguém viu... Como o destino foi caprichoso, mal sabia Mariana que subia mais alto do que aquela bela flor, subia aos céus.
“Ela está louca! Deve ser internada”... “Nunca! É meu amor, minha vida, nunca!” E desde então vivem Carlos e a pequena Nina, que é pequena em sua alma, como foi a pequena Mariana, e todos os dias tomam, Nina e Carlos, sorvete de chocolate após dar chá ao urso azul de olhos de marfim e as bonecas de pano.
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